segunda-feira, 2 de junho de 2008

A Responsabilização dos titulares dos órgãos sociais das sociedades anónimas

A Responsabilização dos titulares dos órgãos sociais das sociedades anónimas
A Responsabilidade Civil dos administradores perante os accionistas


O regime geral da responsabilidade civil dos órgãos das sociedades comerciais consta do capítulo vii do título I do Código das Sociedades Comerciais , título que consubstancia a parte geral do código.
Desde já importa salientar que não existe qualquer preceito geral sobre a matéria da responsabilidade civil dos titulares dos órgãos das sociedades anónimas no título IV do Código das Sociedades Comerciais , título dedicado às sociedades anónimas.
A matéria da responsabilidade civil dos titulares dos órgãos das sociedades comerciais perante os sócios é essencialmente regulada pelo art º 79, nº1 do Código das Sociedades Comerciais que, sob a epígrafe diz-nos que: " responsabilidade para com os sócios e terceiros " , prescreve o seguinte : " os gerentes administradores ou directores respondem também nos termos gerais , para com os sócios e terceiros pelos danos que directamente lhes causarem no exercício das suas funções " . Esta norma regula obviamente a responsabilidade civil dos administradores das sociedades anónimas perante os accionistas. Desde já importa antes de mais referir que a aplicação da norma pressupõe necessariamente a prévia aquisição da qualidade de accionista pelo titular do direito de indemnização.
A responsabilidade perante pessoas que não são titulares de acções é obviamente uma responsabilidade perante terceiros não uma responsabilidade perante sócios. O potencial adquirente de acções no mercado accionista é um terceiro .
E pressupõe igualmente a prévia aquisição da qualidade de administrador pelo obrigado a indemnizar . A eventual responsabilidade restringe-se à actuação do administrador no exercício das suas funções , isto é durante e por causa desse exercício. A remissão operada pelo art.º 79º, nº1 do Código das Sociedades Comerciais para o regime geral da responsabilidade civil faz surgir a questão de saber se é aplicável o regime da responsabilidade obrigacional ou o regime da responsabilidade delitual ou extra - obrigacional .
O art.º 79º, 1 do Código das Sociedades Comerciais não oferece uma resposta a esta questão pelo que a mesma terá de ser encontrada pelo intérprete. A responsabilidade das sociedades anónimas perante os accionistas não pode ser considerada obrigacional , porque não existe uma relação obrigacional entre os administradores e os accionistas , dada a interposição ( da personalidade jurídica ) da própria sociedade comercial.
Entre os administradores e a sociedade existem vínculos obrigacionais , existe a complexa situação jurídica de administração entre a sociedade e os accionistas existem relações jurídicas , os accionistas tem deveres e direitos ( sociais ) para com a sociedade entre os administradores e os accionistas não existe qualquer tipo de relção jurídica , porque o contrato de sociedade não cria relações jurídicas entre os órgãos sociais e os sócios .
Se em termos naturalísticos é o administrador que actua perante o accionista , no discurso jurídico , a actuação do administrador é imputada a sociedade não existindo uma relação directa entre o administrador ( na qualidade de administardor ) e o accionista ( na qualidade de accionista ). Acresce que o direito societário não impõe aos administradores deveres específicos para com os accionistas apenas são impostos aos administradores deveres genéricos para com os accionistas , logo , sob uma perspectiva substancial , a responsabilidade dos administradores perante os accionistas é exclusivamente uma responsabilidade delitual.
A responsabilidade dos administradores das sociedades anónimas perante os accionistas é necessariamente uma responsabilidade delitual , emergente da violação de deveres gerais legais. Trata-se de uma imputação delitual comum , logo apenas existirá responsabilidade dos administradores perante os accionistas se se verificarem os requisitos estabelecidos no art. 483.º do Código Civil.
No que respeita as modalidades da ilicitude nem toda e qualquer ingerência ou ataque à pessoa ou ao seu património geram a obrigação de indemnizar , os bens jurídicos gerais pessoa e património são muito extensos , por isso ser necessário delimitar os danos ressarcíveis. Nos termos do disposto do art. 483.º , nº 1 do código civil , existem duas formas ou modalidades de ilicitude , a saber : a violação de um direito de outrem e a violação de uma disposição legal destinada a proteger interesses alheios . A primeira forma de ilicitude constituí a violação de direitos absolutos , isto é direitos protegidos ergo omnes tais como o direito à vida , direito à integridade física , os diversos direitos de personalidade , os direitos reais , a propriedade industrial. Na segunda forma de ilicitude constitui a violação de normas de protecção , isto é , de disposições legais que protegem determinado interesse particular , pese embora não confiram um direito subjectivo . Exige-se que a norma da conduta esteja descrita na lei , exige-se que a tutela dos interesses particulares figure entre os fins da norma violada , isto é , que o legislador tenha pretendido proteger os particulares , não bastando o mero efeito reflexo decorrente da protecção de outros interesses ( o interesse colectivo ).
Exige-se ainda que a norma proteja o particular contra aquela precisa espécie de danos ou de prejuízos , contra aquele modo de lesão. Para além das situações da violação de direitos absolutos e da violação de normas de protecção , existe uma cláusula residual de ilicitude , igualmente geradora de responsabilidade civil delitual , tal cláusula residual é o abuso de direito art.º334º do CC. Nos termos desta norma , o exercício anormal de um direito próprio é ilícito , fazendo nascer a obrigação de indemnizar.
Na análise da responsabilidade civil dos administradores perante os accionistas importa fazer uma referência ao conceito de dano mera ou puramente patrimonial . Dano mera ou puramente patrimonial é aquele que uma pessoa sofre sem que tenha existido prévia violação de um direito ou bem absolutamente protegido , tratam-se de situações em que um prejuízo se repercute na situação patrimonial global de uma pessoa sem que tenha sido atingido um bem absolutamente protegido -- prejuízo de interesses financeiros ou pecuniários sem prévia lesão jurídica de pessoas ou da sociedade .
A provocação de danos em bens constitui uma violação do direito absoluto de propriedade , mas a provocação de perdas financeiras sem provocação de danos em bens não constutuí uma violação de direitos absolutos . Pense-se no caso da pessoa que destrói um cabo de rede pública de electricidade , determinando a quebra de fornecimento de electricidade numa fábrica e avultados pejuízos na sua produção , a danificação do cabo de electricidade constituí uma violação do direito absoluto da pessoa proprietária do referido cabo , mas os avultados prejuízos pela quebra de produção na fábrica não constituem uma violação de um direito absoluto.
O património como tal não é protegido em termos absolutos , em situações de danos puramente patrimoniais inexiste ilicitude pós violação de direitos absolutos.
Do exposto resulta que os danos puramente patrimoniais apenas serão ressarciveís em caso de violação de uma norma de protecção ( ou, residualmente, em casos de abuso de direito).
Desde já importa analisar a tipificação de danos eventualmente ressarciveis, com especial efâse nos tipos de danos que podem ser causados na esfera jurídica dos accionistas, dessa forma serão determinados quais os comportamento ilicitos dos administradores e quais os danos efectivamente ressarcíveis em sede de responsabilidade dos administradores perante os accionistas.
Existem essa encialmente dois tipos de danos que podem ser provocados na esfera jurídica dos accionistas, ambos de cariz patrimonial, a saber: a lesão dos direitos sociais dos accionistas e a etinção ou deminuição do valor ( de mercaso) das acções.
A posição social do sócio compreende a existencia de um conjunto de direitos perante a propria sociedade, cujo o titular activo é o sócio e cujo titular passivo é a sociedade, esses direitos são denominados direitos sociais dos sócios e incluem, nomeadamente, o direito aos lucros, o direito de voto e o direito à informação.
Ao coarctar em o exercício dos seus direitos sociais pelos accionistas, os administradores podem causar prejuízo patrimoniais, por exemplo, os administradores recusar-se a prestar informações ou podem prestar informações falsas aos accionistas, podem recusar-se a efectuar uma distribuição de lucros aos accionistas, ou podem impedir um accionista de votar. O valor das acções pode ser afectado por actuações dos administradores directamente ou indirectamente, é afastado directamente através de intervenções no mercado accionista isto é, os administradores podem actuar no mercado accionista por diversas formas., nomeadamente negociando a realização de uma fusão, pondo em prática medidas defensivas face a uma tentativa de tomada da sociedade ( Takeover) o hostil, propondo um management buy out (MBO) ou um leverage management buyout (LBO).
A tomada de sociedade hostil - hostils takeover - é igualmente uma operação de controlo da sociedade, a tomada de sociedade hostil é realizada através de uma oferta de aquisição ( ou de uma oferta de troca) dirigida aos accionistas, os manegement buyout (MBO) e leverage managemant buyout (LBO) constituem operações de controlo da sociedade, determinando uma transmissão do dominio sobre a socie dade. Managemant buyout (LBO) consiste na aquisição da sociedade pelos seus próprios administradores ( ou por um grupo de pessoas onde se incluem os administradores).
No leverage managment buyout (LBO) a aquisição é conseguida com capital obtido à custa da própria sociedade que se pretende adquirir ( nomeadamente por empréstimos garantidos pelo activo da sociedade).Todas estas actuações podem implicar danos na esfera jurídica dos accionistas, nomeadamente uma diminuição no valor das acções, uma perda do dominio da sociedade, uma perda da oportunidade de realizar uma mais valia ( atrvés da transmissão de acções). Todos estes danos são provocados directamente na esfera jurídica dos accionistas, não se trata de danos da sociesdade que reflexamente atinguem os accionistas.
O valor das accões é afectado de uma forma indirecta através de uma deminuição do valor ( do património) da sociedade, que se repercute reflexamente no valor das participações sociais.
A provocação dolosa de danos na esfera jurídica da sociedade ou por parte dos administradores e a gestão negligente determinam uma deminuição do património social e, indirectamente uma deminuição do valor das acções.
Quer a lesão dos direitos sociais dos accionistas, quer a extinção ou deminuição do valor de mercado das acções pelos administradores constituem prejuízos que repercutem na situação patrimonial global dos accionistas sem que tenha sido atingido um bem absolutamentre protegido. A lesão dos direitos sociais dos accionistas e a extinção ou diminuição do valor de mercado das acções pelos administradores não correspondem a violações de direitos absolutos. Em ambos estes casos existe o prejuizo de interesses financeiros ou pecuniários sem prévia lesão física de pessoas ou da propriedade.
Um comentário público de um administrador sobre a situação financeira da sociedade pode provocar uma quebra das acções, existe um prejuízo financeiro sem lesão da popriedade. A não satisfação do direito de obtenção de informação de um accionista por um administrador constitui um dano patrimonial (com valor pecuniário). Não corresponde a uma violação de um direito absoluto.
A lesão dos direitos sociais dos accionistas e a extinção ou diminuição do valor de mercado das acções pelos administradores constituem danos puramente patrimoniais, logo, os comportamentos dos administradores que causem tais danos apenas serão ilícitos ( delitos civis) em caso de violação de normas de pretecção. Os administradores apenas serão civilmente responsáveis perante os accionistas em caso de violação de uma norma de protecção.
Para além da remissão para o regime da responsabilidade delitual comum o art 79º, nº1 do código das sociedades comerciais estabelece que apenqas são imputaveis aos administradores os danos que directamente causarem na esfera jurídica dos accionistas, ao se estabelecer que apenas são imputaveis aos administradores os danos que directamente causarem na esfera jurídica dos accionistas, esta norma consagra um critério de incidência dos danos.
Repare-se que este critério não pretende proceder a uma limitação da extensão dos danos indemnizaveis, o critério respeita à ilicitude, através deste critério são delimitados os comportamentos ilicitos, a operação de delimitação dos factos ilicitos é anterior à tarefa de limitação da extensão dos danos indemnizaveis.
Do exposto passaremos à exemplificação de comportamentos ilícitos desde já a responsabilidade dos administradores perante os accionistas é delitual e que a ilicitude se restringe à modalidade de violação de uma norma de protecção e às situações em que são provocados danos directos na esfera jurídica dos accionistas.
Estabelecidos os contornos da ilicitude na responsabilidade dos administradores perante os accionistas, tentemos identificar e analisar normas de protecção que consagrem situações de responsabilidade civil perante os accionistas.
O art. 519º, nº 1 do Código das Sociedades Comerciais prevê a responsabilidade penal dos administradores por prestações de informação falsas, por sua vez e sob a ep´grafe " convocatória enganosa" , o art 520º , nº 1 do CSC incrimina igualmente possíveis comportamentos dos administradores.
Estas disposições penais não defendem apenas o interesse público ( o bem tutelado por estas incriminaões será a economica pública e não o património), tutelam igualmente interesses particulares dos accionistas.
O art 378º do Código dos Valores Mobiliários consagram o crime de abuso de informação ( privilegiada), essencialmente este ilícito pune quem disponha de uma informação privilegiada e a transmita ou negoceie em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros com base nessa informação. Esta disposição penal defende essencialmente ou interesse público, o bem jurídico tutelado é supra-individual ( o bem jurídico tutelado será a eficiência do mercado ou a função pública da informação), o que é característico de todos o ilicitos contra a economia.
O crime de abuso de informação é um crime de perigo, não é exigido o dano no património dos accionistas ou dos investidores em geral, p legislador operou uma anticipação da da tutela penal, igualmente caracteristica dos ilícitos contra a economia. No entanto, o art 378º do CVM protege reflexamente ou o património dos investidores prejudicados pelo abuso de informação privilegiada, entre os investidores que podem ser prejudicados pelo abuso de informação encontram-se os accionistas.
O abuso de informação pode provocar uma deminuição ou extinção do valor de mercado das acções, nestes termos o crime de abuso de informação privilegiado tutela reflexamente o património dos accionistas.
Dado que está prevista a comissão deste crime por administradores e dado que este tipo penal protege o reflexamente o património dos accionistas, estamos seguramente perante uma norma de protecção em sede de responsabilidade civil dos administradores perante os accionistas.
A respeito da responsabilidade por factos ilícitos o art. 998º, nº1 do CC estabelece uma responsabilidade objectiva da sociedade pelos actos e omissões dos seus representantes, agentes ou mandatários, em tudo identica aos termos gerais consagrados no art 500º do CC. O art. 998º, nº2 vem no entanto referir que o lesado apenas pode exigir dos sócios a satisfação do débito correspondente depois de excutido o património da sociedade e ou do representante, agente ou mandatário. Essa disposição parece por isso afastar a possibilidade de o lesado se dirigir directamente ao sócio nos termos do art 997º, nº2, a razão para esta solução será o facto de a lei pretender possibilitar o exercício do direito de regresso da sociedade contra o autor do dano, o que o sócio por definição não poderá fazer.
Poderá assim por fim a titulo de conclusão dizer-se que o art 79º,nº1 do CSC opera uma remissão para o regime geral da responsabilidade civil.
A responsabilidade dos administradores das sociedade anónimas perante os accionista é necessariamente uma responsabilidade delitual, dada a interposição da personalidade jurídica da sociedade.
O art. 79º,n1 do CSC consagra o critério de incid>ência do dano determinando que apenas são imputáveis aos administradores os danos que directamente causarem na esfera jurídica dos accionistas.




Bibliografia: Direito das obrigações volume III contratos em especial (Luís Manuel Teles de Menezes Leitão)
Da responsabilidade civil dos administradores das sociedades comerciais - António Menezes de Cordeiro
Responsabilidade civil dos administradores perante os accionistas - Pedro Caetano Nunes


Trabalho realizado por:
Frederico Mateus Candeias - Nº aluno 19990164
Irene Gonçalves Sardinha da Silva Soares - 19940300

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