quarta-feira, 14 de maio de 2008

Pinto Monteiro fala de "grave atentado ao Estado de Direito"

Pinto Monteiro fala de "grave atentado ao Estado de Direito" > JNotícias
14-05-2008

Os deputados da comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias quiseram ouvir a opinião do procurador-geral da República e do bastonário da Ordem dos Advogados sobre a nova organização dos tribunais, que ficou conhecida como mapa judiciário. E de ambos quase só ouviram críticas. "É um grave atentado ao Estado de Direito", considerou Pinto Monteiro; "Há autocracia", acentuou Marinho Pinto.

A intervenção do procurador provocou uma reacção inusitada da deputada socialista Sónia Sanfona, que acusou o magistrado de ter sido "tremendista". Mas acabou por admitir "abertura" da maioria para introduzir alterações no diploma proposto pelo Governo. Toda a Oposição gostou do que ouviu.

Para fazer aquela afirmação tão peremptória, Pinto Monteiro fundamentou-se em dois aspectos "perigosos", que são o "não respeito pela lei da paridade entre os magistrados judiciais e do Ministério Público e a atribuição de funções administrativas ao juiz-presidente do tribunal".

"Os magistrados servem para administrar Justiça e não lhes podem atribuir funções administrativas, como a de escolher os sítios onde se estacionam os carros ou a de preparar orçamentos. Além disso, a lei exige que ambas as magistraturas tenham os mesmos direitos e deveres, o que não está previsto neste projecto de lei. Estes dois aspectos têm de desaparecer do diploma, sob pena de porem em causa o Estado de Direito". A esta afirmação, o procurador acrescentou uma outra ideia crítica, relacionada com a nova organização das comarcas que agrega juízos. Não teve dúvidas em considerar que, neste quadro, "fica dificultado o acesso dos cidadãos à Justiça".

Para todos estes pontos que criticou, o procurador deixou aos deputados proposta de alteração e, no final, revelou optimismo quanto ao desfecho da reforma "Não podemos esquecer que esta mudança é para começar a ser aplicada só em Janeiro do próximo ano e em apenas três comarcas, a título experimental. Por isso, haverá tempo e oportunidade para introduzir alterações".

"Aragem democrática"

Antes de Pinto Monteiro, os deputados ouviram o bastonário da Ordem dos Advogados, que criticou a proposta do Governo para o novo mapa judiciário, considerando que, ao entregar a presidência dos tribunais a um único juiz, promove a "autocracia". Em alternativa, António Marinho Pinto sugeriu a adopção de um modelo que integre, além do juiz, um representante do Ministério Público e um advogado, enquanto representante dos cidadãos.

"Já é tempo de levar algum do espírito do 25 de Abril aos tribunais", disse o bastonário, defendendo que o primeiro passo para levar essa "aragem democrática" seria a criação de um modelo de gestão tripartida.

Por outro lado, segundo Marinho Pinto, o modelo proposto pelo Governo poderá "ameaçar" a independência dos juízes, na medida em que ficarão dependentes do juiz-presidente, um magistrado com mais de dez anos de serviço ou desembargador, de quem "dependerá muita coisa", inclusive "a avaliação dos outros juízes". Uma "hierarquia" não prevista na magistratura judicial e que também já foi criticada pela Associação Sindical dos Juízes.

Marinho Pinto defendeu por último a criação de novos tribunais em todas as sedes de concelhos que os não tenham (cerca de 70) e uma mapa judiciário que não seja feito de acordo com os interesses dos juízes - como diz ser a proposta do Governo - mas dos cidadãos.

Na perspectiva do advogado, devem ser os juízes a deslocar-se à sede de residência dos cidadãos e não estes a deslocarem-se aos tribunais.

"Não se pode pôr o acento tónico nos juízes"

António Pinto Monteiro, Procurador-geral da República

"Se se quer uma Justiça célere e próxima dos cidadãos, os tribunais têm de ter juízes, magistrados do MP, funcionários judiciais e advogados. Não se pode pôr o acento tónico nos juízes".

"O CSM tem demasiado poder"

António Marinho Pinto, Bastonário da Ordem dos Advogados

"O Conselho Superior de Magistratura tem demasiado poder. Fiscaliza o trabalho dos juízes e o recurso é apreciado pelo Supremo, com juízes escolhidos pelo Conselho".

> Publicado no Jornal de Notícias a 14 de Maio de 2008, por Ana Paula Correia e Clara Vasconcelos

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