sábado, 30 de agosto de 2008

OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL

I - A oposição à execução fiscal só pode ter por fundamento facto ou factos susceptíveis de serem integrados em alguma das previsões das várias alíneas do n.º 1 do artigo 204.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.II - A petição inicial de oposição à execução fiscal que manifestamente não contenha algum dos aludidos factos deverá ser alvo de indeferimento liminar






1.1. A..., e mulher, vêm interpor recurso do despacho do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que rejeitou liminarmente a presente oposição à execução fiscal.1.2. Em alegação, os recorrentes formulam as seguintes conclusões.1. Os recorrentes apresentaram em 27 de Abril de 2007 uma oposição à execução fiscal ... Instaurada pelo Serviço de Finanças do Cartaxo; 2. O Serviço de Finanças do Cartaxo recebeu a referida oposição e remeteu-a para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria; 3. A oposição à execução foi recebida no Tribunal, foi conferida e levada à distribuição. 4. Em 19 de Outubro de 2007, os recorrentes foram notificados do Despacho que determinou a rejeição liminar da oposição por se entender que o pedido é intempestivo e porque o circunstancialismo não se enquadra no artigo 204º do CPPT. 5. O prazo de oposição à execução é de trinta dias a contar da data da citação pessoal, tal como resulta do artigo 203° do CPPT; 6. O prazo apenas começa a correr a partir da data da penhora no caso de não ter havido citação pessoal, situação que não se verifica no caso concreto; 7. Os recorrentes foram citados no dia 20 de Março de 2007, tal como resulta da informação do Serviço Local de Finanças do Cartaxo e dos registos com as referências ...e ... ; 8. Uma vez que a citação ocorreu em 20 de Março de 2007, o último dia para apresentar a oposição era o dia 30 de Abril de 2007; 9. O prazo esteve legalmente suspenso entre o Domingo de Ramos e a segunda-feira de Páscoa, ou seja entre os dias 1 de Abril de 2007 e 9 de Abril do mesmo ano, por força do disposto no artigo 12° da Lei n° 3/99, de 13 de Janeiro. 10. Entre o dia 20 de Março de 2007 e o Domingo de Ramos decorreram 11 dias, tendo decorrido os restantes 19 dias depois da Segunda-feira de Páscoa (9 de Abril de 2007), pelo que o último dia para apresentar a oposição era o dia 28 de Abril de 2007; 11. O dia 28 de Abril de 2007 correspondeu a um Sábado, pelo que o prazo para apresentação da oposição se transferiu para o primeiro dia útil seguinte, que foi o dia 30 de Abril de 2007; 12. Ainda que se começasse a contagem do prazo de oposição a partir da data da notificação da penhora, nada seria alterado, uma vez que a referida notificação foi também efectuada no dia 20 de Março de 2007, como se comprova através da informação do Serviço de Finanças do Cartaxo e do registo ...; 13. A oposição apresentada não coloca em causa as liquidações de imposto efectuadas pela Administração Fiscal; 14. Na verdade, a falta de cumprimento voluntário das obrigações de entrega das declarações de rendimentos legitima a Administração Fiscal a determinar o imposto com base nos elementos que tem ao dispor ou com base na aplicação de métodos indirectos de avaliação; 15. A Administração Fiscal não tinha legitimidade para tomar qualquer iniciativa no sentido da cobrança dos impostos, já que a falta de entrega, pelos recorrentes, das declarações de IRS e de IVA se fundou na cessação de qualquer tipo de actividade em Portugal; 16. A oposição à execução não coloca em causa as liquidações mas a ilegitimidade dos recorrentes pelo facto de não haver, desde o início do ano 2000, qualquer actividade que justifique a apresentação de declarações periódicas e o pagamento de qualquer imposto; 17. A obrigatoriedade de apresentação de declarações, ainda que em branco, apenas existe se existir actividade, o que não é o caso dos recorrentes; 18. A inexistência de actividade justifica a ausência legal de pagamento de impostos; 19. A Administração Fiscal aceitou e validou a declaração de cessação, com efeitos a partir do dia 31 de Dezembro de 1999. 20. Os recorrentes entendem dever ser dado provimento ao presente recurso, revogando este Douto Tribunal a decisão posta em crise, substituindo-a por outra que ordene a aceitação da oposição à execução. 1.3. Não houve contra-alegação.1.4. O Ministério Público neste Tribunal emitiu o seguinte parecer.Âmbito do recurso: despacho de indeferimento liminar da petição inicial de oposição por intempestividade e por não ter sido alegado nenhum dos fundamentos admitidos pelo artº 204º do Código de Procedimento e Processo Tributário. Alegam os recorrentes que a oposição é tempestiva e «não estando em causa a legalidade das liquidações mas sim a inexistência de uma actividade profissional que seja geradora de quaisquer rendimentos profissionais, pode concluir-se pela ilegitimidade dos recorrentes em relação a quaisquer dívidas, independentemente da forma como são determinadas» Fundamentação: A nosso ver o presente recurso não merece provimento. É certo que assiste razão aos recorrentes quando alegam que a oposição não é intempestiva. Com efeito o prazo de dedução da oposição à execução fiscal tem natureza processual, sendo-lhe aplicável o disposto no artº 144º nº 1 do CPC, suspendendo-se portanto nas férias judiciais, como é o caso da situação em análise nos presentes autos. Daí que se entenda que, tal como é demonstrado pelos recorrentes, a oposição seja tempestiva. Porém, como se vê do despacho recorrido (fls. 47) a intempestividade não foi o único fundamento do despacho de indeferimento liminar. A oposição foi também rejeitada por não terem sido alegados fundamentos admitidos pelo artº 204.º do CPPT e por ser manifesta a sua improcedência. E na verdade basta uma análise rápida da materialidade descrita na petição inicial para se concluir que os fundamentos invocados se reconduzem à ilegalidade concreta e relativa da dívida exequenda. Ora dispõe o artº 204º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que só pode servir de fundamento de oposição à execução fiscal a ilegalidade abstracta, que não concreta, da dívida exequenda. Como refere Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e Processo Tributário, anotado, 4ª edição, pág. 872, a ilegalidade abstracta não reside «directamente no acto que faz aplicação da lei ao caso concreto, mas reside na própria lei cuja aplicação é feita, não sendo, por isso, a existência de vício dependente da situação real a que a lei foi aplicada nem do circunstancialismo em que o acto foi praticado. Cabem aqui todos os casos de actos que aplicam normas que violam regras de hierarquia superior, designadamente, além das normas constitucionais, as de direito comunitário ou internacional vigente em Portugal ou mesmo normas legislativas de direito ordinário quando é feita aplicação de normas regulamentares. A ilegalidade é abstracta porque, afectando a própria lei, não depende do acto que faz a sua aplicação em concreto». O legislador admitiu porém uma excepção a este princípio, permitindo a discussão da ilegalidade concreta da dívida exequenda nos termos estritos que constituem o fundamento da al. h) do artº 204º do Código de Procedimento e de Processo Tributário Assim, e de acordo com a referida alínea, a ilegalidade concreta da dívida exequenda poderá constituir fundamento de oposição «sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação». Resulta pois expressamente do texto da citada al h) que a discussão da legalidade concreta só é possível nos casos em que o executada não teve ao seu alcance a possibilidade legal de lançar mão do processo de impugnação judicial talhado tipicamente para o efeito. O que bem se compreende já que com tal disposição o legislador veio a consagrar um entendimento, de alguma forma já adoptado pela nossa jurisprudência fiscal nos casos de cobrança de dívidas não fiscais, e que se destinava a garantir efectivamente o principio constitucional do acesso dos cidadãos aos tribunais para defesa dos seus direitos. Não é porém esse o caso subjudice, já que, como resulta dos autos, os recorrentes tinham ao seu dispor a via administrativa através dos meios graciosos e a via judicial através da impugnação judicial, prevista no artº 102º do CPPT. Nestes termos somos de parecer que o presente recurso deve ser julgado improcedente.1.5. Colhidos os vistos, cumpre decidir, em conferência.Em face do teor do despacho recorrido, das conclusões da alegação, bem como da posição do Ministério Público, a questão que aqui se coloca é, em primeiro lugar, a de saber da tempestividade da petição inicial; e, em caso de resposta afirmativa à anterior, a questão é saber se na petição inicial foi alegada factualidade susceptível de integrar fundamento legal de oposição à execução fiscal. 2.1. Em matéria de facto, o despacho recorrido assentou o seguinte.1. A presente oposição foi deduzida contra os processos de execução fiscal nº ... e apensos, instaurados no SF do Cartaxo, por dívidas de IRS e IVA, conforme informação de fls. 12 a 14 dos autos; 2. De fls. 16v a 28 dos autos constam cópias das certidões de dívida emitida pelo SF do Cartaxo em 08/03/2007, onde se refere que o prazo de pagamento voluntário terminou em 30/11/2003; 13/12/2003; 11/06/2004; 28/06/2004 e 19/05/2004. 3. Os Oponentes tiveram conhecimento da penhora dos bens levada a efeito no processo executivo referido em 1 do probatório, por carta registada e aviso de recepção que assinaram em 20/03/2007 - cfr. fls. 30, 30v e 31, 31v dos autos. 4. E apresentaram a petição que deu origem à presente oposição em inicial em 30/04/2007 - cfr. fls. 2 dos autos.2.2. Sobre o “Prazo de oposição à execução”, preceitua a alínea a) do n.º 1 do artigo 203.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário que a oposição deve ser deduzida no prazo de 30 dias a contar da citação pessoal ou, não a tendo havido, da primeira penhora. E, sob a epígrafe “Rejeição liminar da oposição”, o artigo 209.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, na alínea a) do seu n.º 1, que, recebido o processo, o juiz rejeitará logo a oposição por a mesma ter sido deduzida fora do prazo.O referido prazo de 30 dias para deduzir oposição à execução fiscal só se conta “da primeira penhora”, no caso de não ter havido “citação pessoal” – já que, se tiver havido “citação pessoal”, é a partir da “citação pessoal” que se conta o prazo de 30 dias para a dedução de oposição à execução fiscal.Ora – sendo a citação o acto pelo qual se dá «conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada acção», nos termos do n.º 1 do artigo 228.º do Código de Processo Civil –, fácil é concluir que aquela realidade assente no probatório sob 3., de que «Os Oponentes tiveram conhecimento da penhora dos bens levada a efeito no processo executivo referido em 1 do probatório, por carta registada e aviso de recepção que assinaram em 20/03/2007», é verdadeiramente constitutiva do acto da “citação pessoal” dos oponentes, ora recorrentes, para os termos da execução fiscal, a que por meio destes autos deduzem oposição. Sendo certo que, pela referida carta registada recebida em 20/03/2007, os oponentes, ora recorrentes, foram efectivamente citados de que contra eles corre o processo de execução fiscal nº ... e apensos, «na importância total de € 150.075,37, podendo, querendo, no prazo de trinta dias a contar da citação, deduzir, requerer o pagamento em prestações ou a dação em pagamento» (cf. fls. 30).Como assim, e considerando que, por força do disposto no artigo 12.º da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, o prazo esteve suspenso entre o Domingo de Ramos e a Segunda-feira de Páscoa (entre o dia 1 de Abril de 2007 e o dia 9 de Abril do mesmo ano), não há dúvida de que o último dia para apresentar a oposição à execução fiscal era o dia 30 de Abril de 2007. Na verdade, entre o dia 20 de Março de 2007 (data da citação pessoal dos oponentes, ora recorrentes) e o Domingo de Ramos decorreram 11 dias; os restantes 19 dias, para completar os 30 dias, decorreram depois da Segunda-feira de Páscoa até ao dia 28 de Abril de 2007, que foi Sábado – pelo que, nos termos legais, se transferiu o prazo para o primeiro dia útil seguinte, o dia 30 de Abril de 2007, precisamente o dia em que deu entrada a presente oposição à execução fiscal.E assim se vê que o despacho recorrido não está com a razão quando decide que «o pedido é intempestivo».Apresenta-se, no entanto, acertado o despacho recorrido a rejeitar a oposição, «manifestamente condenada à improcedência», por não se enquadrar «em nenhuma das alíneas do art.º 204.º do CPPT».Para tanto expende o despacho recorrido como segue.A oposição à execução fiscal funciona na dependência do processo executivo (embora com tramitação autónoma), como contestação à pretensão do exequente (cf. Jorge Lopes de Sousa in CPPT Anotado 4ª. Edição 2003 pág. 865.), respeita aos fundamentos supervenientes que podem tornar ilegítima ou injusta a execução devido a falta de correspondência com a situação material subjacente no momento em que se adoptam as providências executivas tendo por efeito paralisar a eficácia do acto tributário corporizado no processo executivo.E visa a extinção da respectiva execução com base em fundamentos supervenientes ou de ordem formal – cf. Alberto Xavier, in Conceito e Natureza Tributário, Almedina, 1972 pág. 586 e seguintes – vd. art.º 204.º do CPPT.O próprio processo de execução fiscal é já um processo de natureza judicial (art.º 103.º n.º 1 da LGT) apesar de correr os seus termos perante as autoridades administrativas. O oponente no seu articulado invoca a ilegitimidade mas põe em causa a legalidade das liquidações por não ter exercido actividade no período a que as mesmas respeitam. Ora a ilegalidade da liquidação da divida exequenda só é susceptível de constituir fundamento de oposição se a lei não assegurar meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação (al. h) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT).Trata-se, como refere Jorge Lopes de Sousa in CPPT Anotado 4ª Edição 2003 pág. 907, “…de situações em que seja a própria lei que não prevê meio de impugnação contenciosa...” No caso em apreço o oponente, tinham a via administrativa através dos meios graciosos e/ou a via judicial através da impugnação judicial a que refere o art.º 102.º do CPPT. [fim de citação]Como é sabido, a oposição à execução fiscal só é permitida nas hipóteses e com os estritos fundamentos previstos no artigo 204.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário – cf., correspondentemente, o artigo 286.º do Código de Processo Tributário, e ainda o artigo 176.º do Código de Processo das Contribuições e Impostos. Com efeito, em oposição à execução fiscal, em princípio, não é consentido apreciar a legalidade da liquidação da quantia exequenda – cf. o disposto no artigo 204.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário [e, correspondentemente, os artigos 236.º e 286.º, n.º 1, alínea h), do Código de Processo Tributário, e as alíneas a) e g) do artigo 176.º, e artigo 145.º do Código de Processo das Contribuições e Impostos]. Na realidade, o processo de oposição tem por escopo essencial o ataque (global ou parcial) à execução fiscal, visando a extinção da execução, ou absolvição do executado da instância executiva, pela demonstração do infundado da pretensão do exequente em face dos fundamentos do artigo 176.º do Código de Processo das Contribuições e Impostos – cf. Laurentino Araújo, Processo de Execução Fiscal, 1968, p. 257 e ss.. Cf., correspondentemente, o artigo 286.º do Código de Processo Tributário, e, actualmente, o artigo 204.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.A ilegalidade concreta da liquidação da dívida exequenda não pode, pois, em regra, servir de fundamento de oposição à execução fiscal.A oposição à execução fiscal, no entanto, poderá ter por fundamento a ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação – cf. o disposto na alínea h) do artigo 204.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário [o mesmo se podendo entender que valia já no domínio do anterior regime; cf. a alínea g) do n.º 1 do artigo 286.º do Código de Processo Tributário; e nota 16. ao artigo 176.º do Código de Processo das Contribuições e Impostos Comentado e Anotado, 2.ª edição, de Alfredo de Sousa, e Silva Paixão].O despacho recorrido conclui, mormente, que «No caso em apreço os oponentes, tinham a via administrativa através dos meios graciosos e/ou a via judicial através da impugnação judicial a que refere o art.º 102.º do CPPT», pois que «O oponente no seu articulado invoca a ilegitimidade mas põe em causa a legalidade das liquidações por não ter exercido actividade no período a que as mesmas respeitam». Na verdade, o oponente e a mulher, ora recorrentes, alegam na petição inicial, como fundamento dos presentes autos de oposição à execução fiscal que «(…) ao invés do que sustenta a Administração Fiscal, a falta de liquidação de IVA e a não entrega da declaração de rendimentos para efeitos de IRS tiveram efectivamente a sua origem na manifesta inexistência de qualquer actividade profissional em Portugal» – cf. artigo 7.º da petição inicial.Assim, os ora recorrentes o que pretendem nos presentes autos de oposição à execução fiscal é discutir a (i)legalidade concreta da liquidação da dívida exequenda.Pelo que o presente caso é realmente de indeferimento liminar manifesto, por não conter a petição inicial nenhum motivo (ou causa de pedir) integrante de fundamento legal de oposição à execução fiscal – como, neste ponto, bem decidiu o despacho recorrido, o qual, por tal sinal, deve ser mantido, com a presente fundamentação.E, então, a terminar, havemos de convir que a oposição à execução fiscal só pode ter por fundamento facto ou factos susceptíveis de serem integrados em alguma das previsões das várias alíneas do n.º 1 do artigo 204.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.A petição inicial de oposição à execução fiscal que manifestamente não contenha algum dos aludidos factos deverá ser alvo de indeferimento liminar. 3. Termos em que se acorda conceder parcial provimento ao recurso, revogando-se o despacho recorrido, na parte em que julgou extemporânea a oposição, que é tempestiva, e mantendo-se aquele despacho no demais.Custas pelos recorrentes, solidariamente, na proporção do vencido, fixando-se a procuradoria em um sexto.

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